quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Entrevista com Arthur Ruiz Patroclo - Campeão brasileiro de xadrez rápido

Nome completo: Arthur Ruiz Patroclo
Cidade Natal: Porto Velho - RO
Idade: 21 anos
Rating FIDE: 2132 (novembro 2012)

Logo após o título houve confusão a respeito de teu Estado e cidade natal. Onde tu nasceu?
Eu nasci em Porto Velho RO dia 19 de outubro de 1991, mas a partir 2002 vivi em Aracaju SE.

Onde tu reside atualmente e por quê?
Eu moro em Pelotas.Vim para cá pelo ENEM. 
Que faculdade tu está fazendo? Qual universidade?
Faço Artes Visuais (Bacharelado) na Ufpel.
Que relação tu faz do xadrez com o teu curso? 
O meu curso tem muita relação com o xadrez. Afinal xadrez é uma arte rsrsrs. Meu pai sempre comentou comigo sobre Marcel Duchamp, o artista que abandonou tudo para dedicar-se ao xadrez e revolucionou a arte do século XX.Duchamp dizia: "Percebo que poucos artistas são enxadristas mas todo enxadrista é um artista." Lá na faculdade como no xadrez o que diferencia um do outro é o tipo de insanidade.
 Comotu aprendeu a jogar xadrez? 
Aprendi com meu pai, mas não era bom no jogo e tinha dificuldade de concentração. 
Teve algum bom professor ou tu é autodidata? 
Cheguei a ter 2 aulas com um rapaz em Porto Velho que não me lembro  o porque, mas ele era campeão de lá na época e me falou sobre a importância do centro.
Tive aulas com a Professora Clara em Aracaju. O que me impulsionou no aprendizado foi o PerssonalChesstrainer do Gilberto Milos. Tinha uma versão em casa, depois de começar a estudar por esse método (muito bom para mim naquela época que como disse tinha dificuldade de raciocínio e só contava com disciplina e força de vontade, repetir a posição várias vezes me ajudava a entender melhor). Depois de usar por alguns meses esse programa chamei a atenção de Chico Pitanga, uma pessoa fantástica que adora o xadrez, além de sempre me motivar, me contava muitas histórias sobre enxadristas famosos e me convidava para jogar com os mais velhos nos bares. Chico me apresentou a Goes, um senhor muito alegre que perdeu várias tardes comigo praticando “lance do mestre” e me ensinou a amar a Dragão.
 Quem foi teu maior incentivador?
Minha mãe sem dúvida. Sempre gostei de participar de competições, mas quando novo quase nunca ganhava. Estudei 5 anos de tênis de mesa,mas nunca fui bom. Quando comecei a estudar xadrez e participar de torneios aos 13 anos, sempre nos primeiros torneios perdia e voltava revoltado, minha mãe sempre me disse que deveria aprender a controlar a minha raiva e aprender a aceitar as frustrações (sempre tive problemas de gastrite). Ela me levou a muitos torneios e sempre paciente no retorno me ouvia, consolava e me dizia para estudar mais, confiando só nas minhas experiências.
Como tu costuma treinar? 
Eu hoje em dia não tenho uma rotina de estudo, faço exercícios táticos e estudo finais (um gosto que não sei de onde veio). Geralmente jogo partidas rápidas na internet e só estudo de maneira séria quando vou mal em um torneio, ou perco de maneira desastrosa. Faço às vezes também exercícios do midllegame da convekta.
 De que forma te preparou pra jogar o brasileiro? 
Na semana anterior do Brasileiro estudei 40 horas totais,totalmente focado em melhorar a concentração e seriedade com que encararia as partidas e estratégia. Além de muito exercício tático. Até cometi uma grave erro no estudo daquela semana que não tinha jogado, só estudado e praticado, a prática real faltou e todos os enxadristas sabem o mal que é estudar sem jogar. Reli  rapidamente. "Meu Sistema”, "Xadrez Vitorioso Estratégia”, estava muito revoltado com o xadrez ridículo que apresentei nos Jubs e tive a sorte de que pela greve minha universidade teve o calendário todo mudado e o mês de outubro não teve Aula.
Ao iniciar o torneio, tu tinha como foco o objetivo de se sair campeão?
Não, meu único foco era ficar entre os 5 colocados para ter dinheiro para jogar a Semi-final do Brasileiro região 2. Minha ideia era ir de lá de Forquilinhas para Vitória de ônibus e aproveitar no ônibus preparar o repertório de abertura que ia usar no torneio. Quando chegasse lá mendigaria para o Rodrigo Borges um pedaço do seu quarto, já que ele ganhou hospedagem em Dois Irmãos.
 Quando tu percebeu que o título brasileiro poderia ser teu, como tu te sentiu?
 Meio pressionado, mas tinha como foco os 5 primeiros,quando ia jogar com um dos mestres fazia uma oração interna (o que importa é o tabuleiro, ele não importa, o que importa é como está o tabuleiro). Meu maior medo era não ficar entre os 5. Comecei a pensar o tão frustrado ia ficar se não ficasse entre os 5. Tinha uma motivação oculta, queria impressionar uma certa guria importante para mim em Novo Hamburgo.
 E depois que tu confirmou o título, qual foi a primeira coisa que veio a tua cabeça?
Tenho que ligar para minha mãe, preciso dizer para ela que seu filho ainda pode ser o Super- Homem que dizia que seria quando tinha 5 anos. 
Tu superou jogadores fortíssimos e experientes ao longo do torneio, que característica do teu jogo tu acha que fez tu te sair vitorioso nesse torneio?
 Meu meio jogo nesse torneio estava bem consistente (diferente do Jubs). Conseguia entender bem o que a posição pedia e controlei bem o tempo também. 
Qual foi a partida mais especial do torneio? Por quê?
A minha partida contra o Disconzi. Ambos estávamos com 5 pontos e quem ganhasse seria o novo líder do torneio. Foi uma partida bem caótica usei um ataque índio do rei não ficando muito bem na abertura, sendo que hora um tinha a vantagem na mão, depois passava para outro. A partida teve 3 ofertas de empate durante. 2 dele e 1 minha e nenhum dos 2 parecia querer admitir para o outro o risco de perder.
 Gostaria de dedicar a alguém esse título? 
Gostaria de dedicar esse titulo a todos aqueles que não se importam com o próprio rating, muito menos de seus adversários. A todos aqueles que não temem o risco, que jogam xadrez porque amam e agradecem pela honra que é ter conhecido esse jogo durante a vida. E a todos aqueles que trocariam tudo isso por um sorriso de guria. 
Que trilha sonora tu escolheria para essa conquista?

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Arthur Ruiz Patroclo - respeitem esse jogador, ele é Campeão brasileiro!

O dia 28 de Outubro de 2012 será para sempre uma data muito especial para o Xadrez brasileiro e principalmente para Arthur Ruiz Patroclo. Ao vencer na última rodada o MF Flávio Olivência, o jogador Sergipano de 21 anos de idade sagrou-se o primeiro Campeão Brasileiro de Xadrez Rápido reconhecido pela FIDE. Na sua jornada enfrentou fortíssimos jogadores, entre eles quatro MF`s e um MI, finalizando o torneio com um rating performance de 2362. No presente post a gente vai acompanhar a saga de Patroclo no torneio e no próximo, como muitos devem estar curiosos para saber mais sobre esse jogador que arrematou esse importante título, acompanharemos uma excelente entrevista exclusiva concedida por ele para esse Blog.

Arthur, outubro de 2012.

Na primeira rodada Patroclo de negras enfrentou o enxadrista Derlei Florianovitz, um dos líderes da forte equipe de Chapecó. A seguinte posição crítica foi alcançada:

Derlei Florianovitz x Arthur Patroclo

Nas palavras de Patroclo: "apartir da posição foi jogado 1.... Bxf3 2. Bxf3 Dh4 3. Bxg4.fxg4 4.Cxg7.Rxg7 houve troca de damas e um final relativamente simples de vencer.


na segunda rodada jogou uma das partidas que com certeza foi uma das mais lindas do torneio: jogo ativo, pra cima, destemido, com direito a sacrifício e mate. Apreciem a análise do campeão brasileiro:

Arthur Ruiz Patroclo X MF Charles Gauche 

1.e4 c5 2.Cf3 a6 já tinha visto em torneios anteriores o Gauche jogando essa variante e perdendo de maneira esmagadora.Conhecia a idéia de levar para a Alapin fazendo com que o a6 parece bastante ilógico,tem uma partida do Grischuk vs Darcy Lima que vi a uns 2 anos atrás bem instrutiva dessa variante. 
3.c3 levando para a variante Alapin. 3. ... b4 fiquei surpreso com esse lance,não entendia  mais o que estávamos jogando,só fiz um desenvolvimento lógico mesmo.
4. d4 Bb7 5. Bd3 e6 confesso que não fiquei meditando que formação de peões meu adversário ia atuar.Em casos semelhantes,prefiro simplesmente ver um problema de cada vez,mas achava que a partida viraria uma Ruy Lopez,como o ritmo era de 25 minutos não dediquei nenhum segundo em cálculo na abertura,apenas fiz o café com leite.

6.0-0 cxd4 não entendi pq ele me daria a casa c3 para o Cavalo. Talvez esse lance seja um erro.Talvez uma formação ...d6,Cbd7,Be7 Com algumas prevenções em h7 antes do roque fosse preferível. 
7. cxd4 Cf6 8. Te1 Bb4 não entendia as intenções de abertura das negras. 
9. Cc3 


9. ... d5 momento critico da abertura,demorei alguns instantes para perceber o horrível bispo Branco que as negras tinham criado e a inútil casa que o cavalo buscava ir em e5,cheguei a ver por alguns instantes 10-exd5...mas ao ver o Cavalo indo a d5 a casa f6 para o outro quadrúpede,diagonal do bispo a8 h1 minha tendência a jogar com o peão de d isolado foi sasciada,as negras teriam superado os problemas na abertura meus olhos arderam.Busquei entender mais de perto que vantagem as negras esperariam ter em uma posição serrada.

10. e5 Ce4 é um cavalo bonito ninguém tem dúvida. 11. Bd2 Cxd2 conseguindo o par de bispo,perdendo tempo com trocas,e criando uma posição fechada,para os cavalos,alem de grandes possibilidades de um ataque ao rei para o bando branco.Gauche fez todos os lances com incrível convicção,nesse momento estava com uns 2 minutos de vantagem e não havia marcas de arrependimento.Manter o cavalo com 11-...Bxc3 pode ser melhor,mas a posição se simplifica muito e torna o jogo ainda mais simples para as brancas.Seguiria:12-bxc3.Cxd2.(Caso joguem f5,não precisaria pensar em variantes...a posição solta do rei negro+o buraco em e5,e a possibilidade de abrir o centro me dão boas expectativas)13-Dxd2.h6.e só a 2 planos:se as negras roçarem,as brancas põem tudo que puder na ala do rei e usa o peão de “c” como baba,se não roçarem,chumbo na outra ala com a4.Como são essas as possibilidades,faria h4,lance de espera que ganha espaço e prepara a abertura de uma coluna futura.e dependendo da resposta negra,um desses 2 planos seriam colocados em eficiência.

12. Dxd2 g6 me alegrava muito esse lance. Olhar o adversário criar buracos em seu campo próximo ao rei trás boas expectativas de harmonia de ataque.12-...h6 parece mais natural. 13. Dh6 Bf8 A dama só foi pra la para chamar o bispo mesmo ^ ^ 
14. Df4 Bg7 ambos os bispos estão problemáticos,faço uma serie de lances posicionais sem um objetivo predeterminado,apenas harmonia mesmo.as notas musicais que vi são.g5,f4,superproteção do peão de d... 15. h4 Cc6 16. Tc1 h5 17. g3 Bh6 18. Cg5 De7 19. Rg2 0-0 20. Ce2 Tac8 21. De3 Ca5 
22. b3 Da3 aqui fiz uma cara de desdém, e atuei um pouco parecendo preocupado as negras fizeram progresso na ala da dama.conquistaram a casa a3,meu próximo lance demonstra que a ala da Dama não tinha tanta importância assim... não calculei nada,apenas vi que a torre fora da defesa não iria para f4,após 23-Bxg5.fxg5,24-Dd3) 

23. Txc8 não calculei nada,apenas vi que a torre fora da defesa não iria para f4,após 23-Bxg5.fxg5,24-Dd3.Txc8 o mais cômico desse lance foi ver o gauche em duvida entre capturar de bispo e de torre,de bispo segue:24-Bb1.seguido da tomada da coluna de c,com o pensamento de que em um final o bispo ruim das negras pesaria ao meu favor Gauche tomou de torre com a mão tremendo como se dissese:é a coisa na ala do rei ta feia,espero que ele não veja um sacrifício. 


24.Bxg6! fiz esse lance muito rápido, Gauche fez o seu famoso mudra de mãos sobre a testa,agora ele pensou um pouco mais ainda parecia confiante.

24....fxg5 25. Dd3 um lance de ataque lento que só é possível pela falta de peças negras na ala do Rei,não sabia se teria força para um ataque decisivo,mas vi que pegaria 3 peões e o rei negro ficaria nu,isso já me assegurou proteção caso o lance no fundo fosse furado. O resto da vitória as peças fizeram sozinhas, eu apenas as movi.para onde elas diziam gostar mais. 
25...De7 26. Dxg5+Dg7 27. Dxe5+Rh8 28. Cf4.Bxg4 29. hxg4 Tc6 30. De8+Dg8 31. Dh5+ Dh7 32. De8+ Dg8 33. Th1+Rg7 34. De7+ abandono. O que mais gostei desse final foram as 2 peças fora de jogo das negras,isso me marcou e demonstra que o plano do Gauche não condizia com a realidade da posição.


Na terceira rodada Patroclo, jogando de negras, sofreu sua primeira derrota das duas no torneio ao enfrentar o MF Bolívar Gonzalez. Nas palavras dele mesmo "essa partida foi uma dragão, errei em não previnir uma manobra do cavalo b5, houve algumas complicações, ambos no final tínhamos menos de 50 segundos."


Na 4ª rodada Arthur enfrentou João Carlos Orguim e na 5ª jogando de negras enfrentou Claudionor Pirola. A partida segue abaixo, mas está incompleta. Patroclo novamente nos diz mais ou menos o que aconteceu: "Contra o Pirola, fomos para um final de torre e acabei pegando o peão de "e" (e5) dele. Depois para conseguir contra-jogo Pirola sacrificou o peão de "a", mais o de "g" e criou um peão passado em h. O mate ocorreu com peões de g e f na terceira fileira apoiando o mate com a torre em a1."


Na sexta rodada Arthur venceu o jogador curitibano Justo Reinaldo Chemin e na sétima e importantíssima rodada, Patroclo venceu jogando de brancas um dos melhores jogadores brasileiros:  o MI Rodrigo Disconzi. Arthur resume para nós suas impressões a respeito da abertura da partida:

"Na abertura fiquei com receio de abrir rapidamente o centro com os avanços padrões de d4 tornando o jogo demasiado aberto, mas confesso que fiquei mal por não realizar essa manobra lógica. Disconzi não soube aproveitar a posição depois de Dg4.tornava a pensar apenas em potencializar a coluna f e ganhar espaço na ala do rei.Mas com algumas manobras ruins dele de Cavalo,pude jogar em um dado momento c4(na abertura meu grande medo era sempre o avanço de d5,pensava se ele avançar,as coisas vão ficar dificeis),fechando o centro e diminuindo a partida a um simples tema de Cavalo superior a Bispo."



A partida continuou muito lutada e no desenrolar dos acontecimentos, a seguinte posição com o lance para as negras foi alcançada:

Arthur Ruiz Patroclo x Rodrigo Disconzi

Nas palavras de Patroclo: "No diagrama eu ofereci empate pro Disconzi ,pois na minha cabeça naquele momento Ba5 me deixaria em uma posição bastante restringida e que deveria tomar muito cuidado.Mas manobrando corretamente não a mal nenhum nesse lance. Aqui o Disconzi capturou de Dama o peão de b Dxb2. Segui com xeque em f1+ com a torre e tomada do peão de a branco. Segui com lances preventivos de torre diminuindo as possibilidades do bispo e tentando a infiltração delas na sétima, seguido da captura do bispo de alguma maneira que não me lembro. Disconzi continuou ate o final." 

Na oitava rodada, Arthur sofreu sua segunda derrota no torneio contra o forte jogador MF Haroldo Cunha dos Santos. Mas mesmo assim foi para a última rodada empatado com 6 pontos com outros 3 jogadores: o próprio MF Haroldo Cunha, o MI Rodrigo Disconzi e o MF Flávio Olivência. Disconzi empatou com o MF Frederico Matsuura, Haroldo perdeu para o MF Alfeu Bueno. Portanto a partida decisiva foi entre Patroclo e MF Flávio Olivência. Mais uma vez Arthur jogando de brancas foi para cima, sem medo de ser feliz. Não deu outra, foi coroado depois de uma bela partida como Campeão brasileiro de xadrez rápido. Apreciem a partida do título:



Depois dessa verdadeira epopéia Arthur Patroclo entrou para história. Saiu do anonimato rumo ao olimpo do xadrez brasileiro. Haroldo de Souza, narrador da rádio bandeirantes, sempre que (por exemplo) o Grêmio entra em campo, narra: "Aparece a máquina tricolor em campo, respeitem esse time, ele é campeão mundial!" Sempre que o Arthur estiver diante de um tabuleiro, lembrem-se: "respeitem esse jogador, ele é campeão brasileiro!"

Informações do torneio:
Chess-Results

Mais informações e fotos:
Xadrez Gaúcho