segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

III Copa das Nações - Santana do Livramento


No dias 17 e 18 desse mês tive a oportunidade de, mais uma vez representando o IXC, jogar um grande torneio. Sem dúvidas o mais forte torneio que ocorreu nesse ano no Estado. O torneio que teve apoio da FUNDERGS (Fundação de Esporte e Lazer do RS), além de não cobrar inscrição, ofereceu hospedagem e alimentação - algo raríssimo em se tratando de xadrez brasileiro. 

Café da manhã em Santana do Livramento
Ao lado o árbitro do torneio e ao fundo o Pelotense Anderson Donay

O evento ocorreu na bilíngue Santana do Livramento e teve a participação de 51 jogadores de diversas nacionalidades que disputaram 15 rodadas de um xadrez duramente competitivo, mas sem grandes problemas para a arbitragem. Dentre os jogadores nada menos do que 9 Mestres Internacionais e 6 Mestres Fide. Os três melhores brasileiros da competição foram Allan Gattass em 6°, Alfeu Bueno em 11º e esse que vos fala que ficou em 15°.

Consegui fazer partidas muito boas contra os mestres contra os quais joguei. Alguns deles me escaparam no detalhe (como sempre) que foi o caso dos MIs Argentinos Pablo Barrionuevo (2336) e Cristian Dolezal (2433), outros jogaram com precisão invejável até que minha posição entrasse em Colapso como no caso de minhas partidas contra o MF Kevin Paveto e o MI Hernan Filgueira. 


Eider Cruz x MI Pablo Barrionuevo
Posição complicada para o MI

Minha melhor partida no torneio foi pela 12ª rodada contra o Bi-campeão Nacional Uruguaio Daniel Izquierdo (1992-2006).  Abaixo disponibilizo a partida para reprodução:


Infelizmente nesse fim de semana de puro xadrez, mais uma vez um torneio importante da FGX foi realizado na mesma data de outro torneio também importante. Mas a isso os jogadores gaúchos parecem que já estão acostumados. 

Gostaria de agradecer imensamente o apoio do IXC em mais essa empreitada em prol do xadrez. 

Maiores informações e demais fotos: 

                                                                                             


quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Robert James Fischer revisitado


É comum de tempo em tempo sair reportagem sobre o lendário enxadrista Estadunidense Bobby Fischer em diversos veículos de comunicação. Não é para menos, pois a revolução que ele causou no mundo do xadrez é digna de ser lembrada, estudada e louvada sem sombra de dúvidas. Dessa vez a reportagem que saiu no jornal on-line britânico TheGuardian foi a respeito de uma entrevista feita com o atual campeão mundial, o indiano Vishwanatan Anand, na qual ele declara ter se encontrado com Fischer em 2006. Alguns detalhes do relato de Anand me perturbam desde que eu comecei a ler sobre a biografia do Grande Mestre que no início da década de 70 mudou o rumo dos acontecimentos do xadrez mundial. Pretendo nesse post comentar sobre alguns desses detalhes que na minha opinião fazem toda a diferença quando discutimos a repeito de Robert James Fischer.

Na primeira frase da entrevista Anand diz: " eu encontrei Bobby Fischer surpreendentemente normal e calmo". Baseado em décadas de um discurso preconceituoso a respeito da personalidade de Fischer, Anand esperava encontrar uma pessoa louca e descontrolada. Sabemos que a mídia enxadrística vem reproduzindo sempre a mesma coisa desde a década de setenta: excêntrico, maniático, esquizofrênico, paranóico e coisas mais nessa mesma linha de raciocínio. E conceituando-o dessa maneira tão veementemente e por tanto tempo acabou-se criando um senso comum muito forte na imagem desse gênio. O resultado é que não vemos mais os fatos com os nossos olhos e sim a partir de um discurso pre-estabelecido. Discurso esse que tem uma finalidade muito específica: silenciar a perigosa visão de mundo do maior jogador de xadrez de todos os tempos.



Perigosa pra quem? essa pergunta é muito ingênua pra ser respondida secamente. Mas lembramos que o auge do gênio em questão coincide com o auge da guerra fria onde tudo era uma questão de ponto de vista, de posicionamento e que as opiniões eram formadas a seu respeito levando-se em conta o lado em que se estava na luta política. Fischer, inevitavelmente, levava consigo o peso de sua nacionalidade para onde quer que fosse e era símbolo de uma ideologia capitalista anticomunista pautada pelo individualismo exacerbado. Portanto, podemos dizer sem medo de errar que ele não era visto com bons olhos pelo lado socialista do mundo - e, como sabemos, a nação ícone do socialismo era a união soviética que, por sua vez, dominava o cenário do xadrez mundial. Korchnoi, Petrosian, Spassky, Tal, são apenas alguns das dezenas de nomes que podem ser citados.

Como o xadrez acabou se tornando mais uma extensão da intensa luta política entre duas ideologias antagônicas que apenas se aproximavam em seus paradoxos, não era interessante para a URSS um herói norte-americano, sobretudo se esse herói fosse carismático. E Fischer em 1962 teve um dos seus maiores sucessos em sua curta trajetória no xadrez: ele venceu o Interzonal de Estocolmo com 2,5 de vantagem sobre os seus maiores rivais soviéticos, finalizando com 80% de aproveitamento e sem ter sofrido uma derrota sequer. Segundo Korchnoi nos conta em sua autobiografia intitulada no castelhano El ajedrez es mi vida... y algo más a imprensa soviética tinha grande influência sobre os meios de comunicação, ainda mais quando se tratava de xadrez e foi desde então que começou a campanha de difamação da personalidade de Bobby Fischer.

"Fischer comenzó a ser criticado en todo el mundo del ajedrez como una persona que se comportaba de forma inapropriada, causaba escándalos y violaba las reglas elementales de conducta, provocando innumerables problemas en los torneos tanto a los organizadores como a los participantes". (P.52)      

No entanto, Korchnoi na sequencia de seu relato, diz que pelo que ele recorda pouquíssimos jogadores tinham do que reclamar de Fischer, pois sua conduta diante do tabuleiro era impecável e que suas "chatices" em relação aos organizadores contribuiram de forma decisiva para a profissionalização do xadrez. Mas nesse momento os problemas com a imprensa e com a construção do discurso do senso-comum dos enxadristas pelo mundo todo tinha em contrapartida os meios de comunicação ocidentais que prestigiavam Bobby e faziam uso de sua imagem como propaganda política Estadunidense. Até então tudo ocorria bem para Fischer, pois era assim mesmo que funcionava o jogo de opostos na guerra fria - mal falado lá, bem falado aqui, não havia como ser diferente.

É quando as idéias políticas de Fischer começam a se tornar mais complexas e perigosas também para o ocidente que seus reais problemas com seu posicionamento perante as coisas do mundo iniciam. No entender dele os paradoxos da sociedade capitalista se tornam tão nocivos quanto os paradoxos da sociedade socialista. A "ditadura do capital" sustentada e legitimada pela aparente imaculável democracia é tão sanguinária quanto a "ditadura do proletariado" soviética. Tudo se mescla, o bem e o mal se fundem no turbilhão de idéias do gênio. Seu anticomunismo acaba se tornando também antimericano e ele solitário abandona tudo. Numa carta de boas vindas ao Ocidente destinada ao dissidente soviético Korchnoi, Fischer chama essas forças de Forças do Mal. Para tentarmos entender melhor essas idéias, abaixo disponibilizo essa carta traduzida por mim ao português:

Pasadena 9 de junho de 1977

Querido Victor, como está você?Fico feliz que as coisas estejam funcionando para você em sua nova vida. Eu vi seu amigo Ives Kraushaar hoje e nós nos demos muito bem. Fico feliz que ele esteja te ajudando a se ajustar à vida do ocidente. Por causa de minha atitude intransigente em relação ao comunismo, eu tive meus problemas, mas assim é a vida. Eu não acredito em comprometimento, acomodação e submissão ao mal. É assim que são todas as coisas. Espero te ver nos Estados Unidos, na Europa ou em qualquer outro lugar logo. 

Tudo de melhor e felicidades para você.

Bobby Fischer

Nessa carta fica claro o seu anticomunismo, mas se pensarmos no que ele diz a respeito de ser contrário ao "comprometimento, acomodação e submissão ao mal" talvez possamos pensar em algo muito mais abrangente. Em 1992 Fischer deliberadamente desobedece o decreto que diz que nenhum cidadão Estadunidense poderia em hipótese alguma entrar num país socialista sem autorização do Estado Americano: sabemos que ele jogou o match revanche comemorativo dos 20 anos de sua vitória pelo título mundial em 1972 contra Spassky na Ioguslavia que era um país de regime socialista. Na ocasião, Fischer cuspiu publicamente num documento oficial do estado americano que o proibia de entrar no país Ioguslavo, demonstrando total negligência com suas leis e com a sua própria cidadania. Essas idéias eram perigosas demais para a manutenção do status quo capitalista. Bobby se identificava com a luta de Victor contra as forças opressoras da ditadura soviética, pois ele mesmo tinha uma luta parecida no ocidente. Era preciso silenciar o seu discurso. Por essa razão a imprensa ocidental também comprou o discurso a respeito de Fischer que já era muito bem conhecido e aceito no leste europeu e começa a insistente reiteração às suas deficiências psicológicas. A idéia que até hoje é estampada em qualquer reportagem que tenha relação a Bobby Fischer é a de desvalorização de seus pensamentos, de seus discursos políticos, taxando-os simplesmente de paranóicos: não há como dar valor para o que um louco fala.

Voltando a entrevista citada no início do texto, Anand influenciado por décadas de prática discusiva sobre Bobby Fischer em Jornais, Revistas, Rádio e Televisão, não consegue ver outra coisa a não ser Bobby preocupado com gente que o esteja seguindo e segundo Anand isso simbolizava que sua paranóia nunca o havia abandonado. Talvez ele estivesse preocupado com jornalistas - apenas isso. 
 
Embora Fischer pudesse ter vivido uma vida muito bem ajustada como campeão mundial, com muito dinheiro e fama, ele escolheu ir para um outro lado na luta política mundial ao não se submeter, ao escolher um lado muito específico em sua ideologia quase anarquista, ao se negar ser marionete no complexo jogo das relações de poder. Num jargão muito bem conhecido pela psicologia podemos concluir que Robert James Fischer era um Desajustado.

Com a palavra Marthin Luther King:


                                                                                                    
Referências


KASPAROV, Garry. Meus Grandes Predecessores V.4. Ed. Solis. Santana de Parnaíba, SP: 2006

KORCHNOI, Viktor. El ajedrez es mi vida.... y algo más. Ed, Chessy. Santa Eulalia de Morcín, ES: 2010

http://www.guardian.co.uk/sport/2011/dec/02/vishy-anand-small-talk-interview

Bobby Fischer tells the truth nothing but the truth

http://www.youtube.com/watch?v=QryuMf8qZ0g Acesso em: 23/12/2011

Bobby Fischer Spits
http://www.youtube.com/watch?v=RjbaSVXUq5c&feature=related Acesso em 23/12/2011

                                                                                                                                                             

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Xadrez na Zero Hora


No dia 04 de dezembro de 2011 saiu na Zero Hora em um caderno especial do Fronteiras do Pensamento distribuído somente para assinantes, uma matéria a respeito da vinda de Kasparov à Porto Alegre. Na reportagem foi ressaltada a importância da prática do xadrez nas escolas como ferramenta auxiliar ideal para o desenvolvimento de competências intelectuais. Na ocasião respondi algumas perguntas feitas pela repórter do Fronteiras Sonia Montaño e pude contribuir um pouco ao que se refere à simultânea no Chalé da Praça XV.

Abaixo está a reportagem escaneada. Acredito que para quem ainda não teve a oportunidade de ler será muito interessante, posto que é fato raro o nosso tão amado xadrez sair em uma página inteira num veículo de comunicação de larga escala.








quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Faça o que eu digo mas não faça o que eu faço - Parte II

Depois da final do Oncosinos e dos Jogos Regionais de Santa Catarina, joguei a semifinal do campeonato gaúcho que para mim até agora é uma incógnita o porque de sua realização, posto que a final do estadual foi um torneio aberto. Talvez o torneio se explique pela disputa pelas 3 vagas na semifinal do Brasileiro. Seja como for, tive a oportunidade de mais uma vez enfrentar o Eduardo Munoa. Nessa ocasião eu tinha absoluta certeza da variante que ele jogaria contra uma índia do rei. Preparei a variante Mar del Plata com o "apoio" de Gligoric. Uma variante aguda, arriscada, em que o preto inicia uma avalanche de peão na ala do rei e o branco um forte ataque na ala da dama. É preciso muita cautela e coragem para ambos os bandos, mas é fato que eu ultimamente tenho arriscado muito mais do que de costume.


Eduardo Munoa 1 x 0 Eider Cruz
Outubro, 2011
- PGN

Infelizmente não tenho foto dessa partida, então ficaremos só com o diagrama. Gosto de pôr fotos sempre que posso, pois elas aproximam o acontecido do acontecimento tornando mais vivo o passado. Acho que nenhum evento de xadrez poderia ficar sem fotos - grande falha do organizador.

O diagrama acima surgiu a partir de 27. Tac1? que é sem sombras de dúvidas um erro, pois permite 27. ... Txc1 28. Dxc1 Dd8 e não há defesa para o peão de b6. Nesse momento eu tive certeza que havia superado meu adversário e no meio jogo havia conseguido melhores chances. Mas no decorrer da partida o Munoa fez lances fortes e enérgicos, enquanto os meus lances denotavam a minha queda de rendimento. É importante notar também como as peças passivas do branco se tornam monstras no arremate da partida. Esse tipo de revolução não se pode nunca permitir.

29. Bb5 Lance ativo que inicia a minha confusão. Não queria de jeito nenhum a ativação desse bispo por isso o lance profilático. 29. ... Te7 ao invés disso era possível diretamente Dxb6 e se Be8 então Tc7. 30. Dc4 Dxb6 31. Dc8+ Cf8 32. Bf1 O branco ficou com medo da ameaça Tc7-Tc1+-Txh1+-Dxf2, mas na verdade com 32.Be8 existe a possibilidade da seguinte linha de empate 32. ... Tc7 33. Df5 Tc1+ 34. Rh2 Txh1 35. Rxh1 Dxf2 36. Bf7+ Rh8 37. Dxh5 Ch7 38. Bg6 e agora não resta mais nada para o preto a não ser dar xeque-perpétuo.

32. ... Tc7 33. Dd8 Rf7 34. Dg5


Jogam as pretas - um plano finíssimo para vitória

Nessa posição as negras tem um plano fino a sua disposição para a vitória. Eu só pensava em esconder o meu rei atrás de minhas peças menores e depois disso ganhar o peão de b e partir para coroação. Mas trazer a torre para a ala do rei resulta muito mais eficiente, pois mantém todas as peças brancas sem jogo e se batento atrás de suas próprias linhas defensivas. Realmente finíssimo: como é bonito o xadrez. 34. ... Bf6 35. Dxh5+ Rg8 e a torre se prepara para entrar em ação, destruindo com as peças estagnadas do meu adversário. 36. Df5 Tf7! O branco está sem lance. 37. Bd3 Be7 38. Dg4+ Tg7 39. Dc8 Th7 40. Dg4+ Rf7 Com um pouco mais te tempo no relógio, ou um pouco mais de xadrez era bastante possível enxergar a trasposição da torre para a ala do rei.

34. ... Tc2? 35. Dxh5+ Re7 36. b4 Txf2 37. Cxf2 e o cavalo entra em jogo depois de sua longa ibernação. 37. ... Dxb4 38. Cg4 Dc5+ ainda estava confiante na vitória mediante o avanço do meu peão passado e não tomei precauções necessários para a segurança do meu rei. 39. Rh2 b5 40. Dg5+ Rf7 41. Dd8 no momento exato meu adversário faz a transferência de ala de sua dama. 41. ... b4 42. Ba6! b3 43. Bc8 Para que se preocupar com um peão passado. Melhor é colocar todas as peças na cara do rei adversário. 43. ... b2?? o erro decisivo Da7 manteria ainda a partida com chances iguais. 44. Be6+ Cxe6 45. dxe6 Rg6 46. e7 1-0 Essa foi a minha derrota mais dolorida desse ano. Mais uma vez o Munoa me escapa.

domingo, 11 de dezembro de 2011

Faça o que eu digo mas não faça o que eu faço - Parte I

Fim de ano! Festas! Férias! mais tempo para respirar. Não que eu não goste das minhas atividades do dia a dia, mas é que me sobra muito pouco tempo para me dedicar à arte, ao xadrez. E sem arte não há ser humano, isso é fato. Mesmo sem tempo para me dedicar eu digo que se dane e vou jogar, brincar, rir, perder, ganhar: experienciar o mundo através do xadrez já que ele se tornou parte essencial daquilo que me move.

E depois da minha viagem para Xaxim, joguei mais dois torneios bastante importantes e pude ver mais claramente algumas dificuldades técnicas minhas que são em essência (na minha opinião) problemas de formação do meu xadrez. Como nunca tive ninguém que me orientasse tecnicamente desde minha tenra infância enxadristica, sempre fui aprendendo as coisas tomando porrada mesmo. E tem coisas que por mais que eu tome porrada, simplesmente não aprendo (pra minha infelicidade possivelmente a maioria das coisas). Por isso no decorrer de algumas postagens pretendo apresentar 8 posições de partidas minhas jogadas nesse ano nas quais por algum motivo ou outro (ou por puro capivarismo mesmo) acabei não fazendo a escolha de plano mais adequada e não consegui explorar as oportuinidades que me apareceram nessas partidas que julgo estar dentre as minhas mais importantes desse ano.

Como não sou profissional do xadrez, me sinto a vontade para comentar sobre meus pontos fracos. Meu objetivo é compartilhar minhas experiências com meus alunos e todos os demais leitores do meu blog. Se esse material por ventura for usado contra mim em minhas futuras competições, como muitos já vieram me falar, isso muito pouco me importa. Alias, vou ficar até feliz por ter adversários me tornando mais forte ao tentar explorar meus pontos fracos.

A primeira posição que eu quero comentar vem da minha partida contra o Mestre Internacional Sérvio Dragan Stamenkovic. Tive a oportunidade de jogar contra ele na Final do Circuito Oncosinos de Xadrez Clássico.





A posição acima surgiu a partir do 20. Tfd1 por parte do meu adversário. Depois de uma intensa luta na abertura, consegui resolver muitos dos problemas que me foram apresentados. No entanto, me sobraram ainda dois problemas que são perigosos a longo prazo: a fraqueza dos peões de a7 e c5. Em contrapartida a essas fraquezas, consegui situar minhas peças em casas bastante ativas. Meu cavalo que pode causar problemas em f4 e meu bispo controlando a diagonal h1-a8 compensam a debilidade de minha estrutura. As torres dobradas na coluna "d" não me causavam tanta preocupação, pois acreditava que essa vantagem não era assim tão grande já que as outras peças não estão articuladas com esse domínio. Acredito que dá pra se dizer também que a atividade de minhas peças menores compensam a atividade das peças maiores do meu adversário. A partir do diagrama acima colocado, eu poderia ter jogado a seguinte variante que faria da tarefa de vencer do Mestre Internacional um pouco mais complicada: 20. ... Bd5! 21. Dxc5 único 21. ... Tfc8 22. Da3 Txc4 e se não fosse pelas possibilidades táticas do branco nesse momento a posição preta estaria em perfeita armonia. 23. Td1xd5 Txc2 Não exd5 por Txg6+ ganhando a dama. 24. Td1 Tac8 seguido Cf6-d5 e o negro não tem nada a temer.


Ao invés de entrar nessas complicações que senti muitas dificuldades de calcular durante a partida, resolvi jogar um lance mais simples e com efeito mais concreto e imediato: colocar problemas em cima do cavalo de f3. 20. ... Df6 O bonito desse lance também é que ele ativa a dama, centralizando-a. Veja o domínio das diagonais que cortam o tabuleiro que as peças negras possuem. 21. Ce1 Quando se tem que fazer um lance desses numa posição como essa é porque algo não vai bem. Mas não há outra opção: o Mestre Internacional teve que colocar o orgulho de lado e fazer o melhor lance que tinha a sua disposição, mesmo que ele faça doer os olhos a primeira vista. 21. ... Cf4 22. Rf1 apesar desses lances passivos é difícil encontrar alguma maneira de explorá-los de forma eficiente. Resulta que no final das contas o domínio da coluna d segura toda a posição branca. Por esse motivo 20. ... Bd5! recebe um ponto de exclamação, pois coloca em xeque essa soberania das torres ao controlar a importante casa d5. Agora c5 está caindo de maduro e é preciso defendê-lo. 22. ... Tfc8 23. De3 O famoso ditado: não tem o que fazer, melhora a posição das tuas peças. 23. ... g5 o meu plano é inicar uma avalanche de peões ao rei do meu adversário, jogar Rg7, uma das minhas torres por trás da tropa e confiar que atividade de meu cavalo e de meu bispo exerça pressão suficiente na posição do meu adversário - infelizmente o plano não saiu do papel, digo, da cabeça. 24. Td2 Rg7 25. g3 Cg6 26. Cd3 Df3 27. Dxf3 Bxf3 28. h3 h5? o erro que tira todo o orgulho da minha posição, o meu bispo de casas brancas. 29. Bd1 Bxd1 30. Txd1 Embora praticamente seja difícil converter essa posição, a partir desse momento o meu apuro de tempo aliado com as minhas debilidades fizeram com que meu forte adversário conseguisse o ponto depois de uma batalha bastante interessante.

No mesmo torneio, joguei pela última rodada contra o Dr. Antônio Rogério Crespo. Tenho Score francamente positivo na soma de nossos confrontos, mas como se mostrou mais uma vez: os tabus são feitos para serem quebrados. Depois do meu vigésimo lance a seguinte posição foi alcançada:



Não há porque eu não ser sincero: nesse momento eu senti que a fatura já estava liquidada. Mas é sabido, depois que as mãos já estão calejadas, que são esses os momentos mais importantes de uma partida e que não é permitida queda de rendimento, pelo contrário, é preciso estar ainda mais concentrado. Falhei mais uma vez nesse quesito. Tenho uma explicação muito peculiar para isso, quem sabe eu a exponha em alguma futura postagem. Os amigos que se interessarem podem me perguntar pessoalmente.


Ao que se refere à partida, eu tinha motivos muito bons para estar confiante, os pontos de ruptura estão dominados (c5, f6) e há fraquezas latentes nas casas pretas do meu adversário. Mas contra todos os meus prognósticos, Crespo que é conhecido por ser um jogador muito ativo e criativo lança sua ofensiva pelo centro, confiando em criar problemas pelo peão sacrificado a partir da exposição do meu rei. 20 ... c5! é incrível, mas nem sequer tinha calculado a possibilidade desse lance. Os meus subsequentes erros vieram a partir dessa surpresa. Temi de subremaneira 21. dxc5 De6, que coloca pressão imediata na coluna "e" e aparentemente coloca também à mostra as debilidades de meus peões "g3" e "g5". A partir dessa mudança no rumo dos acontecimentos e por consequencia da mudança das características da posição, não enxerguei o simples e vencedor 22. c6 Bxc6 23. Dxc6 Dxc6 24. Cf6 Dxf6 25. gxf6 Tad8 26. Bc6 Ao invés disso joguei 21. d5? e de pronto me vi em sérias dificuldades ao fornecer a casa e5 como trampolim central para as peças do meu adversário. 21. ... c4+ desc. 22. e3 Te5 Ainda consegui no decorrer da partida criar alguns problemas e no final inclusive ainda tive chances reais de vitória, mas acabei sucumbindo mediante um golpe tático já no apuro de tempo.


sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Matéria de Xadrez no Jornal Opa!

Na página 12 de sua edição do mês de novembro, o jornal Opa! publicou uma matéria de xadrez com minha participação. Na ocasião fui entrevistado pela jornalista Marta Reckziegel que é também autora do excelente e ilustrativo texto da reportagem. Esse Jornal é distribuído em colégios, cursinhos e universidades, portanto tem um público jovem bastante forte e abrangente. Excelente para a divulgação do nosso tão querido esporte-ciência.


Quero deixar aqui meus agradecimentos ao jornal Opa! pelo espaço dado para o xadrez e à repórter Marta pela matéria.

Espero que gostem e sintam-se a vontade para fazer seus comentários.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Copa Unisinos - Campeão!

Segundo torneio que jogo pela UFRGS esse ano e mais uma vez me saio campeão. Espero que essa boa sequencia possa continuar também nos Jogos Universitários Brasileiro que estarei jogando de 4 a 7 de novembro em Campinas.

Dessa vez tive duas partidas bastante difíceis contra dois catarinenses. Na segunda rodada enfrentei Claudionor Pirola (2101 FIDE) e na terceira o MF Alfeu Bueno (2294 FIDE) que havia, uma semana antes, se sagrado campeão do fortíssimo Torneio Aberto do Brasil em Campos Novos/SC. Com Claudionor joguei a super aguda Botwinnik que fazia muito tempo que não jogava. Me surpreendi quando em casa constatei que até o meu lance 20. Dg4+ o livro de aberturas do fritz acompanhava. Acredito que esse seja um bom sinal de evolução conceitual, pois achei todos os lances no tabuleiro analisando a posição e não por memória - o mesmo já havia acontecido na partida contra o Rodrigo Borges em que puni severamente os erros de abertura de meu adversário.






Contra o MF Alfeu ocorreu a mesma variante da partida do Maico analisada no post anterior, portanto eu estava com as ideias bastante frescas na cabeça e pude jogar com energia suficiente para garantir a vitória, depois de ter saído muito bem da abertura.






Destaque especial também para o xadrez feminino que teve partidas muito boas, com as 5 meninas demostrando um bom nível de xadrez com excelentes possibilidades de evolução. Dessa vez minha namorada Kétina não foi no torneio somente para me acompanhar, mas também para jogar. E para quem aprendeu a jogar somente ouvindo meus monólogos sobre xadrez e pratica muito pouco, ela foi muito bem em suas partidas.


Viva à Beleza do xadrez!

Nota divulgada no site da UFRGS:
http://www.ufrgs.br/ufrgs/noticias/alunos-da-ufrgs-conquistam-medalhas-na-xxiv-copa-unisinos

Informações completas e demais fotos:

Xadrez Gaúcho



quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Jogos Regionais de Santa Catarina em Xaxim - Ouro!

Devagarinho alguns torneios importantes vão escapando do alcance deste blog. Mas o que ando eu fazendo da vida que não o atualizo? Vivendo-a acima de tudo, além de namorar, trabalhar, estudar, viajar...: a sina de todo rapaz de vinte e quatro anos, latino americano de sangue e de sonho e sem dinheiro no banco.

E dessa vez estive jogando, de 23 a 27 de setembro, a etapa regional dos Jogos Abertos de Santa Catarina em Xaxim pela linda cidade de Itá que fica na região oeste de Santa Catarina fronteiriça com o Rio Grande do Sul, a beira do rio Uruguai. Voltando o olhar para as belas paisagens que o rio e a vegetação que o circunda nos proporciona é possível no longe ter uma visão que a primeira vista parece apocalíptica: uma igreja emersa nas águas, ostentando com orgulho suas duas torres.





Isso se deve ao fato de Itá ser uma cidade totalmente nova que subiu morro acima, pois a velha, que ficava em uma planície, foi inundada depois que a usina hidrelétrica de Itá foi ativada em 1999 e hoje dorme nas profundidades do Rio. A cidade, somando esse fato inusitado relatado acima, tem um potencial turística enorme e recomendo-a veementemente àqueles que se interessarem em conhecer essa região de Santa Catarina.



E foi por essa linda cidade que nossa Equipe foi campeã e se classificou com louvor para jogar a estapa estadual do JASC que ocorrerá em novembro em Cricíuma. Diogo Luiz de Oliveira, Maico Rodrigo Cesco, Eider Cruz, Renato Vailon e Ernesto Damo foram os guerreiros da conquista inédita para a cidade, superando a tradicional Equipe de Chapecó.


Para se ter uma idéia até mesmo o Prefeito da cidade fez questão de participar da comemoração:



Itá, setembro 2010


O que pude notar no estilo dos jogadores catarinenses foi o gosto geral por partidas agressivas, por linhas ativas de ataque direto. Bem diferente do estilo do jogador gaúcho que é mais seguro, posicional, dando preferência para vantagens de longo prazo. Tá aí um dado histórico interessante de se pesquisar se for fato mesmo e não só fantasia de uma mente mirabolante.

Algumas reportagens a respeito do Ouro de Itá no xadrez:

http://www.esportesnarede.com.br/noticias.php?titulo=It%C3%A1+estreia+no+xadrez+e+consegue+vaga+nos+Jasc&page=1&idNoticia=E0

http://esportecomjorgeroberto.blogspot.com/2011/09/time-estreante-no-xadrez-consegue-vaga.html

http://www.radiobelosmontes.com.br/noticias.php?tipo=leitura&idnot=8957


Para finalizar coloco a disposição a análise da melhor partida jogada por um dos membros da nossa equipe durante a competição. Ela foi jogada por Maico quando estávamos enfrentando Chapecó, a equipe mais forte que tínhamos pela frente. As análises foram feitas sem auxilio de engine, portanto sintam-se a vontade para comentar e corrigir qualquer aspecto da partida e dos comentários.

Por Maico Rodrigo Cesco

Gostaria de dizer que fazia muitos anos que eu não jogava xadrez em campeonatos. Fazia uns 4 ou 5 anos que não competia e por isso desculpem os erros pois não coloquei pra analisar no fritz.

Eider, é um grande prazer estar no seu blog e também foi ótimo ter conhecido você! Tudo de bom pra ti, você é um jogador muito técnico e tenho certeza que tem um futuro brilhante. Vamos ao que interessa!

1.e4 c5 2.Nc3 Depois de muito tempo sem jogar eu queria uma partida mais animada do que um siciliana fechada poderia prometer, mas eu estava errado e em breve meu adversário começaria um ataque a baioneta. 2...d6 3.f4 e6 4.Nf3 Nf6 5.Bb5+ Sinceramente, de negras sempre gostei quando optam por essa continuação, me sinto bem pegando logo de cara o par de bispos!

5...Nbd7 6.d3 Be7 7.0–0 a6 8.Bxd7+ Nxd7 [8...Bxd7 9.e5 Nd5 10.Ne4 Na hora vi isso e me pareceu que as brancas tomam a iniciativa e ficam bem colocadas! Teria que dar uma olhadinha no fritz.] 9.a4 b6 10.Qe1 0–0 Conceitualmente achei estranho, mas... vamo ver... 11.g4 [11.Qg3 Bb7= Era o que eu conhecia já a muitos anos, um planinho bem tradicional.] 11...Bb7³ 12.Qg3 Qc7 Então veio a definição do seu ataque, passei muito tempo analisando e cheguei a conclusão que a ameaça será g5 seguido de f6 com problemas sérios. Assim baseei minha variante na defesa do avanço f6. 13.f5



exf5 14.gxf5 f6 Profilático [14...Bf6 Analisando mais tarde com o Fritz, Eider e Diogo percebemos que Bf6 não deve ser descartado, mas o final da variante não é promissor para as pretas e com o lance que joguei para que as pretas conservem maior contra-jogo.15.Kh1] 15.Rf2 Rf7 Prevenir Bh6. 16.Rg2 Ne5!? 17.Nh4 Rd8 18.Nd5!?

Recupera o par de Bispos. Pretende fechar o centro e enfiar o ataque na ala do Rei, se não der certo e a posição abrir ainda conserva peças menores diferentes! 18...Bxd5 19.exd5 Bf8 20.c4 Qd7! Achei ótimo, deixa tanto f4 como a4 sob pressão. Faz com que as brancas tenham que ficar sempre se preoc upando com estes pontos, além do que prepara a ruptura libertadora b5. 21.Bf4 Ra8 22.b3 Ra7 23.Kh1 b5!O lance libertador! 24.Ng6 Veio para o sacrifício. [24.Rga2!? Merece algumas análises 24...bxc4 25.dxc4=]


24...bxc4 [Não 24...hxg6 25.fxg6 Nxg6 (25...Re7 26.Qh4 Com mate!) 26.Qxg6 bxa4 A posição não me pareceu clara! 27.bxa4² ; 24...Qxf5 25.Nxf8 Kxf8 Também pareceu muito bom!] 25.dxc4 Qxf5!³ [Me pareceu inferior: 25...hxg6 26.fxg6 Nxg6 27.Qxg6±] 26.Nh4 Único. 26...Qc8 27.Rf1 Rab7 28.Rgf2 Qg4! Trocar as peças e entrar no final mellhor! 29.Bxe5 Qe4+ 30.Rf3 fxe5 31.Kg1 Rxf3 32.Rxf3 Rf7 [32...Qd4+ 33.Kh1 Qd1+ 34.Kg2 Qc2+ 35.Kg1µ] 33.Rxf7 Kxf7 34.Qh3 Quando analise 28... Dg4 até aqui minha ideia na hora tinha sido responder Dh3 com algum lance que sinceramente não me recordo agora, mas mudei e joguei a continuação que analisei.


34...Qe1+ 35.Kg2 Qd2+! 36.Kh1 Qc1+! 37.Kg2 Qg5+ 38.Kh1 Qf6 Assim com essa linda manobra de dama todos os meus problemas parecem estar sanados! 39.Nf5 Kg8 Não queria jogar este, mas não achei outro melhor! 40.Ne3 g6 41.Ng4 Qf5–+ 42.Kg2 h5 43.Nf2 Qxh3+ 44.Nxh3 Be7 45.Kf3 [45.Nf2 g5µ] 45...Kf7 Relâmpago! 46.Ke4 Bh4 47.Ng1 Kf6 48.Nf3 Bf2 49.h3 [49.Kd3 Kf5 50.Nd2 Bh4µ] 49...a5 [49...g5 50.Nh2–+] 50.Nh2 [50.Kd3!?µ] 50...Bg3–+ 51.Nf3 g5 52.Ng1 [52.Nd2 Be1 53.Nf3 Bf2–+] 52...g4 [52...h4 53.Ne2–+] 53.Ne2 Não lembro a sequência mas seguiu até a coroação![53.hxg4 hxg4 54.Ne2 Bf2–+] 0–1





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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Eider Cruz x Rodrigo Borges - Final Circuito Oncosinos de Xadrez Clássico

2° Lugar Prêmio de Beleza

Com certeza uma das melhores partidas da minha vida, mas (pasmem!) tive que ouvir inclusive que nela me faltou criatividade. Para mim ela foi especial não só pelo aspecto alucinante do jogo em si, mas também pelo extra jogo e pela surpresa que o meu simples primeiro lance 1. e4 deve ter causado. Não havia jogado e4 em partidas pensadas e em partidas rápidas nos últimos 6 anos, a não ser uma partida contra o Eduardo Munoa na qual fui severamente massacrado. Sabendo que com certeza meu adversário atual campeão gaúcho esperava jogar uma Índia do Rei ou uma Benoni Moderna, julguei por bem surpreendê-lo logo de cara, já que estava seguro que ele jogaria a defesa Siciliana. Nesse momento, eu acredito, já estava um passo a frente na luta que seria travada.

1.e4 c5 2.Cf3 d6 3.d4 cxd4 4.Cxd4 Cf6 5.Cc3 a6 6.Be3 e6 Aqui estava esperando 6. ... e5, ao qual estava preparado pra responder com 7. Cb3 Be6 8. f4. Como não foi o caso, me vi agora jogando por mim mesmo, sem preparações prévias, somente crente na minha vantagem psicológica que não sabia ao certo se era verdadeira ou não, mas a sentia e isso é o que importa. Pensei nas linhas do Ataque Inglês com f3, Dd2 e o-o-o, mas não me senti seguro para jogá-lo, julgando que era exatamente o que meu adversário queria. Portanto, decidi ser mais direto e continuar a minha estratégia de surpreender, colocando no tabuleiro uma posição que acreditava ser a mais diferente possível dentre as que o meu adversário estava esperando.

7.g4! e5



8.Cf5 g6 9.g5 gxf5 10.exf5 A única partida que eu conhecia nessa variante era Judit Polgar x Anand jogada em 1999. Tive contato com ela em 2003 através de uma revista francesa “Europe Echecs” que meu amigo de Canoas, Daniel ramos, havia me emprestado.



10...d5 Se as negras resolvem manter a peça de vantagem com, por exemplo, Cfd7, então Dh5 seguido de roque maior e g6 é praticamente decisivo. É importante notar também a dificuldade de desenvolvimento das peças negras que ficam se batendo nas linhas de trás, enquanto as peças brancas entram facilmente em jogo, controlando a casa d5 e com ataque imparável mediante os peões de f5 e g6, visto que o rei negro além de tudo encontra-se no centro.

11.Df3 d4 12.0–0–0 Dc7?! Esse é o primeiro deslize das pretas. 12. ... Cbd7 era melhor, já que além de se livrar da cravada, desenvolve uma peça de sua ala da dama estagnada. Poderia seguir por exemplo: 13. Bd2 dxc3 14. Bxc3 Bg7 15. Tg1 0–0 16. gxf6 Dxf6 - Como aconteceu na partida acima citada. 13.Bxd4 exd4 14.gxf6



Bh6+? Nessa posição há muitas possibilidades e variantes intrincadas a serem analisadas, mas com certeza Bh6+ não foi o melhor lance. Embora pareça que as negras conseguem mais uma casa para seu rei em f8, ela é muito desconfortável. Há duas variantes principais aqui. A primeira se inicia com 14. dxc3 e a segunda com 14. Cc6. A primeira elimina de cara o cavalo que poderia ficar assustador em d5, mas abre mais uma coluna na cara de seu próprio rei. O interessante é que, com o bispo resguardado em f8, é possível depois do xeque de dama branco na coluna "e", devolver a peça com Be7 e não com Be6. Mesmo assim, com jogo devidamente enérgico do branco, as pretas não parecem ter chances de conservar esperança. A segunda, embora permite o pleno controle da casa d5 pelo cavalo branco, tem a virtude de desenvolver a esse preço as peças da ala da dama afim de achar um porto seguro para o rei. Por exemplo, 14. Cc6 Cd5 15. Dd6 Bg2 16. Bd7 The1+ 17. Rd8.


15.Rb1 dxc3 O grande problema do preto aqui é que seu rei se encontra irremediavelmente trampado no centro e as brancas, embora com duas peças a menos, usam ao máximo o potencial das que lhe restam. 16.De4+ Rf8 17.Db4+ Re8 18.Bb5+ Não é sempre que se tem a oportunidade de se fazer um lance como esse. Sacrifica-se o bispo para a outra torre entrar rasgando nas colunas centrais. 18...axb5 19.The1+ Be6 20.fxe6 Cc6 21.Dh4 As brancas estão com duas peças a menos fenotipamente, mas geneticamente falando estão com duas qualidades a mais.

21...Bd2?! Não é fácil colocar um ponto de interrogação inteiro nessa lance, visto que maneira de salvar a partida é através de uma linha de sacrifício de dama. Embora seja bem difícil poder avaliá-la de forma correta durante a partida, o MF Luiz Ney foi um dos que a sugeriram no Post Mortem. 21. ... Df4 22. Dh5 Dxf6 23. exf7 Rf8 24. Te8+ Rg7 25. Tg1 Dg6 26. Txg6+ hxg6 27. De2 e agora as negras jogam 27. ... Td8 seguido de Tf8 e uma nova fase de manobras se iniciaria na partida com boa vantagem para as brancas, enquanto as negras continuariam sua árdua defesa 22.exf7+ Rxf7 23.Dh5+ Rxf6 24.Txd2 cxd2 25.Df3+ Rg5 26.Tg1+ 1–0




quarta-feira, 28 de setembro de 2011

O conceito Medo no Xadrez

Todo jogador de xadrez conhece a célebre máxima que diz: “a ameaça é mais forte do que a execução.” Conta-se que Nimzowitsch proferiu tal frase quando certa feita estava para jogar contra o forte adversário fumante chamado Vidmar. Nimzowitsch não gostava nada que seus oponentes fumassem durante as partidas. Vidmar, sabendo disso, levou seu cigarro e seu fósforo para a sala de jogos. Durante a disputa ele ficou com o cigarro apagado na boca e com o fósforo na mesa. A simples ameaça de acender o fumo desconcertou Nimzo que não tinha como reclamar e acabou perdendo a partida facilmente.

E nós, enxadristas comprometidos com a causa de Caissa, seguidamente nos vemos ludibriados por uma ameaça que não é objetivamente tão forte, apesar da aparência, e deixamos nossa posição colapsar com lances defensivos e profiláticos, ao invés de iniciar aquele tão querido contra-ataque que poderia ter sido e não foi. Mera questão de conceito? Talvez. Mas eu diria mais: questão de sentimento, emoção, medo – e no xadrez não existe conceito mais importante do que controlar esses aspectos inerentes em qualquer posição, desde o simples primeiro lance da partida.


Jogam as pretas e seguram a posição.


Na posição acima, tirada da partida entre Baadur Jobava da Georgia e Namig Guliyev do Azerbaijão, jogada na Copa do Mundo de Xadrez que aconteceu em Khanty-Mansiysk na Russia no mês de Setembro desse ano, percebe-se que as peças brancas estão assustadoramente colocadas na vizinhança do rei preto. O pobre monarca encontra-se encurralado em h8, com colunas abertas, diagonais e patadas de cavalo atingindo sem piedade o que outrora fora a fortaleza que o protegia. Assusta e assusta muito. Qualquer um poderia nessa posição perder a cabeça e fazer justamente aquele lance defensivo que perde. Foi o que aconteceu com Guliyev que teve que abandonar rapidamente. Vejamos como ele continuou a partida:

1. ... Dc7 2. Txf7 Tf8 3. Taf1 Txf7 4. Txf7 Tf8 e agora nessa posição as brancas tem mate forçado em 4 lances. Desafio o leitor a encontrá-lo.


Brancas jogam e dão mate em 4 lances.


Mas vejamos por outro lado esse intrigante ataque: as virtudes de uma posição não são vistas e são deixadas de lado porque o sentimento de medo que as ameaças impelem nos impede de vê-las. Afinal, o cavalo preto em d4 e o bispo em e5 estão muito bem colocados e, apesar da posição exposta do rei, o centro é controlado harmoniosamente pelas peças e peões pretos. Um conceito muito importante aparece latente nesse momento: se uma ataque em uma das alas se avizinha, mantenha-se de olho atento para o centro, é lá que vai acontecer a verdadeira batalha. Por isso que um ataque em uma das alas só vai ter reais chances de ser vencedor, salve as exceções, se o centro estiver estabilizado. Por que então o branco teve sucesso nessa partida? Porque, a tática, que é o cão de guarda da estratégia, do xadrez posicional, esteve dormindo enquanto soldados inimigos saqueavam o palácio real.

Vejamos como seria possível uma defesa satisfatória, a partir do primeiro diagrama:
1. ... Tg8 2. Txf7 De8 3. Taf1 essa é a parte crítica em que dentre inúmeras possibilidades de defesa, as negras terão que escolher qual, em seu ponto de vista, é a mais promissora 3. ... h6 4. Cd5 exd5 5. Td7 Ce2 + 6. Rf2 Bc8 7. Bf6+ Bxf6 8. Th7 Rxh7 9. Cxf6+ Rh8 10. Dxg8 Dxg8 11. Cxg8 Rxg8 12. Rxe2 – e não há dúvidas de que o pior já passou.

4. ... Cc6 com ameaça de Bd4+ seguido de Cce5 e as peças pretas ficam ainda melhores colocadas.

Não estou dizendo que a posição do preto é melhor ou mais confortável. Mas assim como os lances defensivos são difíceis de serem encontrados, nessa posição também os lances de ataque não são nada fáceis. Qualquer vacilo de ambas as partes pode ser fatal – um vacilo por parte do preto pode levar o seu rei ao xeque-mate e um vacilo por parte do branco pode deixá-lo com grande desvantagem posicional que fatalmente o levará a derrota. Portanto, se estamos com nossa parte conceitual em dia, teremos certamente mais confiança para achar os lances corretos que garantem a nossa permanência firme na partida, pois sabemos que eles têm que necessariamente existir. De outra maneira, se nos sentimos perdidos e não conseguimos enxergar as possíveis virtudes de nossa posição, estamos com certeza fadados ao fracasso.

Estive em situação análoga na última rodada da Semifinal do Campeonato Brasileiro em 2010. Na ocasião eu enfrentava de pretas o MF Frederico Matsuura (Irmão do famoso GM Brasileiro Everaldo Matsuura). A seguinte posição foi alcançada:



Por incrível que pareça eu me sentia mal nessa posição – olhando agora de longe nem mesmo eu consigo entender por que a eminência do ataque branco me cegou tanto os olhos. Na entrevista que eu dei para o Guiga, pouco depois da semifinal, eu falei da seguinte maneira a respeito dessa partida:

“Na última e decisiva rodada, eu tinha a chance, caso vencesse, de ficar entre os primeiros colocados da competição com 5 pontos. Joguei contra o MF F.M e superestimei a posição do meu adversário, fazendo lances defensivos muito fracos, ao invés de pensar no contra-ataque pelo centro e explorar minha maioria na ala da dama. Matsuura se aproveitou da oportunidade e entrou com todas as peças na minha ala do rei e eu tive que abandonar, após algumas especulações.”


A partir da posição mostrada, a partida seguiu da seguinte maneira: 1. ... Te8? Fraquíssimo. A torre não faz nada em e8 – a minha única ideia nesse lance era liberar a casa f8 para que uma peça viesse defender minha ala do rei. O avanço do peão “f” do meu adversário me dava calafrios. Ao invés disso, um plano muito simples era possível: 1. ... Bc6 seguido de Ta8, tomando posse da coluna. O que me fez rechaçar de pronto essa possibilidade foi a seguinte variante: 2. Ch4 Ta8 3. Dg4 – a chegada de tantas peças na vizinhança do meu rei, além do possível avanço do peão “f” foram as razões dos meus subsequentes erros. Eu não consegui enxergar que minhas peças bem articuladas no centro eram suficientes para a defesa e inclusive para pensar na vitória. Depois de 3. ... Rf8 o ataque das brancas é estancado porque o avanço do peão “f” é impossível, pois nesse caso o bispo de e3 ficaria indefeso. 4. Dh5 Db7 e agora que mais o branco pode fazer além de especular com 5. Cg5 C(d7)b6?

2. Ch4 Be7 3. Dg4 Rh8 4. Dh5 Rg8 5. Bxh6 gxh6 6. Dxh6 Bf8 7. Dg5+ Bg7 8. Cd6 Te7 O ataque, apesar do erro, foi parado graças à boa colocação das peças pretas e o domínio do centro. Mas nesse tipo de posição são os nervos que mandam e a dificuldade é que é preciso sempre se fazer os melhores lances, caso contrário o ataque branco volta a ser muito perigoso.

9. Ta1 Bc6 10. Cf3 Cf8 Outro lance estritamente defensivo em um momento que não era necessário. Era possível 10. ... Dc7 e em algumas linhas até f6 pode ser jogado. 11. h4 11. Cc8 era bom. Eu não me preocupei com isso pois na minha concepção trocaria uma torre passiva por um cavalo bastante ativo. Mas no final das contas o final que se apresenta é bastante favorável às brancas. 11. ....Ta7 12. Tb1 Aqui as pretas tomam a iniciativa. O fato é que durante a partida as avaliações são muito obscuras e dificilmente se tem certeza para onde a correnteza vai nos levar. 12 ... Cd3? Uma pena, a seguinte variante daria excelente perspectivas para as pretas: 13. ... Bxe4 14 Bxe4 Ch7 15. Dg3 Rf8 e a maioria preta se prepara para avançar. 13. Dg4 Bxe4 14. Cxe4 Rh8? O erro decisivo. Com 14. ... Ch7 o ataque branco é parado e as vantagens da posição preta aos poucos iriam se fazer sentir. Se 14. Cf6+ as negras simplesmente retiram seu rei para h8. 15. Dh5+ Rg8 16. Cf6+ Bxf6 17. exf6 1-0

Portanto, olho atento para que nossas decisões não sejam influenciadas por fatores psicológicos. Embora seja claro que elas sempre serão, com certeza se tivermos mais atenção a esse fator tão importante do xadrez, menos erros cometeremos e os resultados positivos aumentarão consideravelmente.


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